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Disco de estreia de Diego Perin é um precioso exercício de autocrítica e conscientização

Por: Gustavo Morais

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Em algum momento do relativamente distante ano de 2005, o curitibano Diego Perin formou a Banda Gentileza. Por lá, e ao longo de uma fase que durou 10 anos, tocou baixo e concertina, lançou dois EPs ao vivo e dois álbuns. Com o fim do grupo, em 2016, levantou o voo da carreira solo. Entre um lançamento e outro, chegamos em junho de 2019 e damos de cara com o disco de estreia de Diego, Cuidado Ao Ficar Muito À Vontade.

Ao longo de oito faixas inéditas e autorais, Diego Perin (guitarra/voz) entrega uma sequência de narrativas sonoras ambientadas nos incontáveis cenários de sua própria mente. Os arranjos passeiam por diferentes sonoridades – flertam com balanço do afrobeat, tomam um cafezinho com o caipira interiorano, se jogam mas levadas emocionantes e revisitam os ares tropicalistas do rock. Esse caleidoscópio musical é fruto, também, dos talentos dos músicos Douglas Vicente (bateria), Vinícius Nisi (sintetizadores, teclado e bozouki) e Ruan de Castro (baixo).

Capa do disco Cuidado Ao Ficar Muito À Vontade, de Diego Perin

Cuidado Ao Ficar Muito À Vontade é uma das gratas surpresas do rock autoral brasileiro (Divulgação)

No que diz respeito às letras, Diego Perin entrega textos certeiros pessimistas. Percebe-se doses generosas de niilismo, mas, segundo a definição de Vinícius Nisi, trata-se de “uma dose de otimismo reverso”. Observa-se, no entanto, que o tempo atua como fio condutor desse disco. Cada um à sua maneira, “o antes”, “o agora” e “o depois” aparecem nas canções. Às vezes como nostalgia, em outras como decepção e angústia, mas também como gotas de esperança.

Com a clássica tríade bateria reta, baixo hipnótico e riff de guitarra, a instigante O Que é Que Falta abre o disco. Cantada na primeira pessoa, a faixa fala sobre a rotina egoísta que nos leva a deixar de lado a empatia. Na sequência, sob os ecos do balanço do afrobeat, a música A Ficha Cai toca o terror pros lados das pessoas que optam por ficam em cima do muro.

“Entre conservar o velho pensamento e a juventude, eu já escolhi o meu lado
Nem sempre a sabedoria e a idade são proporcionais
Cuidado ao ficar muito à vontade
pra ficha não cair tarde demais”, vocifera o artista.

E por falar em “muro”, a faixa tem um clipe que é uma baita alua de semiótica [alô, estudantes de comunicação!]. Em cena, Diego Perin simplesmente destrói os alicerces dos insetões.

Outra faixa deliciosa do álbum é a groovada Não Vou Buzinar. Eis uma música sobre o que acontece durante aqueles famigerados segundos após o semáforo ficar verde! A cartilha é a mesma: o sinal abre e o buzinaço começa. Ah, não posso esquecer de comentar que essa canção caberia em qualquer um dos discos do começo da carreira dos Titãs. Na sombria Heróis, também há gotas de conexão com outro personagem do rock brasileiro dos anos 80. Se os heróis de Cazuza “morrerem de overdose”, para Diego o tempo também não para e os heróis já foram até enterrados.

p artista curitibano diego perin

Nem hipster, nem beatnik tardio, nem tropicalista arrependido (Foto/Nicolas Pedrozo Salazar)

Para encerrar o disco, Diego propõe duas experiências sensoriais. Conduzida por um um arranjo meio soul, meio gospel e temperado por blues, Dias Bons é um cenário, é um cheiro, é uma lembrança gostosa. Por sua vez, Agora é um raio de lucidez que paira sobre os sentimentos agonizantes que permeiam o disco. “Esteja aqui agora. E fique presente, aproveite”, são as últimas frases dessa narrativa de oito músicas.

Por fim, mas não menos importante: a audição de Cuidado Ao Ficar Muito À Vontade vai te fazer dançar com o corpo e com a mente. As canções são sedutoras, as letras abrem as portas para diversos insights e a interpretação vocal mostra um artista totalmente seguro do que diz. Em tempos tão incertos, cruéis e cretinos, o disco de estreia de Diego Perin é o incentivo perfeito para que “pensar fora da caixa” seja o mantra nosso de cada dia.

Gustavo Morais